A Casa Frankenstein

A Casa Frankenstein

Um dos piores pesadelos de um arquitecto (embora honestamente a falta de trabalho suplante pela negativa este tipo de angústia) acontece quando um cliente lhe pede uma casa-Frankenstein.

Esta situação caracteriza-se pelo desejo de que a casa que vamos pensar incorpore as mais diversas imagens, retiradas de revistas, de situações que viveu, lugares que conhece ou onde esteve, mas acima de tudo retiradas do contexto.

Não haveria nada de mal em tudo isto se as referidas imagens fossem entendidas como inspirações, preocupações que de outra forma o cliente não consegue transmitir. O verdadeiro problema surge quando tentamos incorporar estes desejos no projecto que estamos a realizar, de forma integrada e coerente e nos dizem – Mas não percebeu, eu quero mesmo que a lareira seja igual à que lhe mostrei, e o barbecue, a escada e a piscina também. Se calhar não viu com atenção as imagens que lhe forneci?

O que poderia ser um conjunto de indicações perfeitamente legítimo, para nos fazer pensar e orientar os nossos esforços de modo a maximizar a resposta que vamos dar às expectativas de quem nos contrata, transforma-se numa imposição de utilizarmos de forma casuística e avulsa imagens, que ainda por cima foram pensadas para um determinado e necessariamente diferente contexto e que na maior parte das vezes não é possível articular de um modo interessante, sem cair no grotesco. Como na história de Mary Shelley, iremos produzir o tal monstro feito com peças ou partes retiradas de outros locais.

Acho que este problema reside, muitas vezes, na ideia preconcebida que algumas pessoas têm do que deverá ser a sua casa, construída por acumulação. Quando vêm uma imagem de que gostam pensam que um dia ainda a irão replicar na sua casa. O que por vezes não percebem é que mais importante do que reproduzir a imagem é perceber a sua essência, o conceito que lhe está subjacente e que esse sim é válido e potencialmente enriquecedor. A reprodução acrítica de uma imagem pode resultar numa realidade caricata. A maior parte das vezes resulta mesmo, porque a escala, o enquadramento, o encadeamento de espaços nem sempre são reprodutíveis.

O mais curioso é que usualmente, quando este cliente vivencia casas em que o arquitecto teve mais liberdade, as aprecia. Fazem-lhe sentido, sem que por vezes se aperceba, a coerência, o equilíbrio e a harmonia. A qualidade do espaço.

Esta questão da forma como algumas pessoas imaginam que a sua casa deva ser tem sido muito estudada e é muitas vezes comparada com a relação que as mesmas pessoas têm com os seus carros: Enquanto esperam que um carro seja o mais moderno possível e que pareça do último modelo, pretendem pelo contrário que a sua casa seja igual à dos seus avós, que não seja esquisita ou demasiado diferente e que sobretudo não se pareça com nada senão com uma casa.

Gostava de perceber a que se deve parecer uma casa. Alguém tem ideias?